quinta-feira, 17 de novembro de 2011

translúcida


São Paulo, 10 de novembro de 2011.

Lembro das noites em que eu acordava só pra te encontrar quando meus sonhos me levavam pra longe. Me fazia bem vê-lo em sono morno e pacato, perdido em abstrações, tal como eu. Seu semblante me fez crer que a vida era feita daquilo ali; dos pequenos momentos de felicidade resguardada, sempre imprevista.

E eu afagava seus cabelos carinhosamente. A textura era boa. Você era bom.

Me fazia sorrir.

E, olhe, foram tantas as noites em que acordei com medo de tê-lo perdido. A mera idéia me prometia a morte ou uma vida infeliz. Mas sorria de novo, tola, ao ver que ainda estava lá, sonhando ao meu lado e torcendo por nós. Sei que torcia.

Mas a vida tem formas estranhas e seguindo caminhos errantes fez algo que parecia tão certo e cheio de pureza, sumir. Foi embora num ponto sem volta. Não creio que tenha.

E, como em um sonho ruim, o chão se desfez, envolveu meus pés sem calos e me arrastou, tentando me afogar. E a força empregada foi tanta, que pensei jamais ser capaz de sair dali um dia. Do poço de tormenta, cólera, ruína.

Pensei não ser mais capaz de sorrir.

E como poderia, se o meu distinto e insensato havia sido tirado de mim? Mas, não, essa não é uma carta de lamúria. É, na verdade, uma carta sobre como saio daquele poço. Não era o que você queria?

Foi sem forças que encontrei decerto a violência dentro de mim. A ferocidade e vontade de viver - aquela, que você sempre lembrava existir em mim. E hoje me pego dizendo Não mais, nunca mais vou perder um segundo sequer! e sei que você ficaria orgulhoso.

Voltei a sorrir e as pessoas chegam pra mim.

Mas não pense que é fácil. Sabe que não é. Me encontro às vezes perdida na multidão, presa com meus temores, embora jamais tenha me sentido tão viva quanto agora. Acho que deve ser o medo.

Mas ainda fujo.

Fujo do que me assusta, da palavra não dita, do embaraço, do olho no olho, da presença, da ausência. Da solidão.

Mas fujo menos.

Não sei se guardo rancor. Se quero ou não. São equivalentes os motivos pra odiar e amar. Mas, afinal, qual é a diferença? Tudo mostra que me importo e só isso basta. E eu sei que você também se importa.

E isso me faz sorrir, de novo.

Mas dói. Então só o que quero é que saia de mim. Sai, por favor, e vá embora! Não estou pronta. Some daqui, some de mim, só pra eu me sentir livre agora. Ser uma amiga, não dá. Hoje não.

Honre sua escolha e suma agora, mas não me amole a toda hora.

Sim, dói. Mas, veja bem. Dói menos. Não morri, nem sou infeliz.

E, sim, você vai sumir de mim.

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